O consórcio de veículos de mídia criado para a divulgação diária de número de mortes e casos de covid-19 anunciou neste sábado (28) seu fim. Faziam parte do grupo: g1, Estadão, Folha de S.Paulo, UOL, O Globo e Extra.
Os veículos de mídia publicaram por volta de 20h textos parecidos anunciando que não irão mais fazer a divulgação em conjunto, depois de 965 dias. O grupo disse ter encerrado “sua missão de garantir a transparência sobre o impacto do coronavírus e da vacinação”.
Embora o consórcio tenha afirmado ao longo desses 965 dias que era realizada uma apuração em conjunto e independente com profissionais dos 6 veículos, na realidade, o grupo dependia dos dados do Ministério da Saúde como qualquer outra publicação que divulgavas as exatas mesmas informações. Quando o sistema do governo federal apresentava problemas, impactando a maioria dos Estados, o consórcio ficava vendido e era evidente que não havia nenhum tipo de apuração independente.
Foi o que aconteceu durante o apagão de dados que se seguiu por mais de 1 mês depois de um ataque hacker de 10 de dezembro de 2021. Vários Estados, como São Paulo, não conseguiram acessar os sistemas federais para obter as informações de seus próprios municípios. Com isso, começaram a ter problemas para reportar novos casos e mortes por covid.
É uma situação esdrúxula. Os Estados precisam que as suas cidades coloquem as informações no sistema federal –pois não têm um sistema próprio para receber esses dados. Só depois, cada secretaria estadual de saúde busca essas informações já consolidadas em Brasília e faz a divulgação localmente. Em suma, ao buscar os dados no Ministério da Saúde ou em cada uma das 27 secretarias estaduais de saúde encontra-se as mesmas estatísticas.
Por causa dessa dependência dos Estados em relação ao Ministério da Saúde, para ter um sistema verdadeiramente independente, o agora extinto consórcio de veículos de mídia precisaria ter ido diariamente e diretamente a cada uma das mais de 5.000 cidades para ter as informações. Isso nunca foi feito, embora ao divulgar suas estatísticas esse detalhe não ficasse claro para leitores, ouvintes e telespectadores que consumiam os dados. Ficava-se com a impressão de que esses veículos do consórcio estavam atuando de forma 100% independente do governo federal. Isso nunca foi verdade.
Em dezembro de 2021, por exemplo, durante o apagão de dados por causa do ataque de hackers ao Ministério da Saúde, o consórcio não conseguiu obter as informações de maneira independente exatamente porque a maioria dos Estados também dependia das informações que eram compiladas pelo governo federal.
O Poder360 utiliza informações oficiais divulgadas diariamente pelo Ministério da Saúde, com dados coletados nas secretarias estaduais de Saúde. Este jornal digital não participou do consórcio de veículos de imprensa, mas sempre apresentou aos seus leitores dados precisos e atualizados sobre a pandemia –os mesmos que eram enviados aos Estados e depois coletados pelo consórcio. Nos momentos mais dramáticos da crise de saúde causada pelo coronavírus, inclusive, o Poder360 foi o único veículo de mídia no Brasil que apresentava regularmente os dados de mortes com as datas de registro das ocorrências e também com as datas reais dos óbitos, informações fundamentais para entender a tendência de avanço ou recuo da doença.
COLETA INÚTIL E NÃO INDEPENDENTE
O Poder360 demonstrou com dados objetivos em agosto de 2020 e em dezembro de 2021 que a diferença nos números divulgados pelo consórcio de imprensa e pelo Ministério da Saúde variou de 0,5% a 1% em relação à busca direta nos arquivos do Ministério da Saúde. E mesmo essas variações se diluíam ao longo de poucos dias e o resultado geral ficava absolutamente idêntico.
Em suma, o trabalho do consórcio era inútil, além de não ser independente, como está demonstrado acima neste post.
ORIGEM DO CONSÓRCIO
A iniciativa surgiu quando o Ministério da Saúde alterou a plataforma com os dados da pandemia no país. O grupo é formado pelos veículos O Globo, Extra, O Estado de S. Paulo, Folha de S.Paulo e UOL.
O grupo foi criado depois que o Ministério da Saúde, de maneira arbitrária, tirou do ar, em 5 de junho de 2020, o Painel Coronavírus. Quando o sistema voltou, passou a ocultar o total acumulado de mortes e casos, indicando só o número de óbitos e diagnósticos confirmados em 24 horas.
A Justiça interveio e determinou que o painel voltasse a exibir os dados integrais da epidemia no país.
A disrupção durou menos de uma semana. Mesmo assim, o consórcio de mídia foi criado em 8 de junho de 2020 sob o argumento de que seria necessário haver um sistema alternativo para manter o fluxo de informações durante outro eventual apagão de dados. Era uma argumentação errada e não verdadeira, pois nunca houve independência do sistema federal de dados.
Do ponto de vista de marketing dos veículos que participaram do consórcio, foi uma boa estratégia. As empresas de comunicação envolvidas na operação se autoconcederam o prêmio Liberdade de Imprensa de 2021 em dezembro desse ano. O consórcio ganhou o galardão da Associação Nacional de Jornais, que vem a ser a guilda dos donos de veículos de comunicação. Em suma, foi um título honorífico dado pelas empresas de comunicação para si próprias.
Na prática, entretanto, o fato é que o trabalho durante todo esse tempo poderia ser feito por qualquer veículo ou cidadão interessado em consultar o que estava nos arquivos do Ministério da Saúde.