BBC Brasil – Ao chegar no pronto-socorro na tarde do último dia 25 de março, Andrea foi diagnosticada com hepatite A e, com a constatação de que suas plaquetas estavam baixas, foi internada. Após cinco dias, o quadro se deteriorou ainda mais. “As outras crianças vinham e saíam e ela ficava, só piorava, piorava. E a gente ali esperando. No quinto dia, ela não queria mais andar. Havia sangue no xixi.”
A menina foi então enviada para a UTI do Hospital Universitário Onofre Lopes, e Tatiana recebeu a notícia de que ela precisaria de um transplante de fígado de emergência. O procedimento, porém, não é realizado no Estado. Teria de ser feito em Fortaleza (CE).
Mas a falta de um avião oficial para o transporte de Andrea atrasou a cirurgia em três dias. Ao fim, o governo do Rio Grande do Norte liberou um avião para a viagem. Às 20h do dia 5 de abril Andrea entrou na fila de emergência para o transplante de fígado. Tinha 24 horas de vida. À meia-noite do dia 6, apareceu um doador – um homem de 46 anos de Mossoró, que teve morte cerebral.
A família do doador disse “sim”, e Andrea conseguiu o transplante a tempo. Um decreto assinado em 18 de outubro pelo presidente Michel Temer, que regulamenta a atual Lei dos Transplantes, reforça justamente o papel dos parentes próximos nesse processo de doação.
Na prática, o novo texto exclui a “doação presumida” – por meio da qual todo brasileiro que não registrasse a vontade de doar seus órgãos era presumidamente um potencial doador -, reforçando a importância da família na decisão de doar ou não seus órgãos.
Outra novidade com o decreto recém-assinado é a inclusão do companheiro como autorizador da doação, por ele ser, atualmente, “equiparado à condição de esposo ou esposa para efeitos civis”. Dessa maneira, não é necessário estar casado oficialmente para dar essa autorização.
No caso de Andrea, a doação foi fundamental, como relembra a mãe: “A minha filha só tinha 24 horas de vida quando entrou na fila de transplante. Estava praticamente morta, já estava entubada, inchada, eu não a enxergava mais. Ela não tinha tempo, precisava que alguém morresse. E isso deu vida a ela”.
‘Urgência absoluta’
Uma verdadeira operação foi montada para viabilizar o transplante da menina.
Duas aeronaves, uma do Rio Grande do Norte e outra do Ceará, foram utilizadas nos esforços para que o fígado chegasse a tempo de salvar a vida dela. A primeira levou a equipe de cirurgiões para retirar o órgão e levá-lo a Natal. Dali, o fígado então partiu no segundo avião para Fortaleza.
Na capital cearense, o médico Huygens Garcia, chefe do Serviço de Transplante Hepático do Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC), aguardava para realizar o transplante.
“Recebi a ligação da Central de Transplante do Ceará, informando que havia a oferta de um fígado em Mossoró, e aceitei de imediato. A Andrea estava com uma hepatite fulminante, que leva à morte quase 100% dos pacientes em 48 horas se não houver transplante. É uma urgência absoluta.”
Andrea, que havia sido primeiro enviada a um hospital pediátrico na cidade, foi transferida novamente, entubada e em ventilação mecânica, para o Hospital São Carlos para finalmente receber o novo fígado.
Quando acordou da cirurgia, o receio era a possibilidade de sequelas resultantes do coma hepático em que ela se encontrava antes do transplante. “Estava com medo de ela não me reconhecer, de ter perdido a memória”, relembra Tatiana. “Mas ela estava normal. Acho que, depois do transplante, ficou até mais bonita. Digo que sou mais apaixonada por ela agora do que era antes.”
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