sábado, 25 de fevereiro de 2017
Consumidor que pagou maior parte de dívida pode ter veículo apreendido
Para o STJ, é inaplicável a teoria de adimplemento substancial em caso de contrato de alienação fiduciária.
A discussão foi na 2ª seção em julgamento de recurso do Banco Volkswagen, que pretendia afastar a teoria aplicada pelo TJ/MG em caso de consumidor que pagou 44 de 48 parcelas da compra de um carro.
Meios menos gravosos
O relator Marco Buzzi votou nesta quarta-feira, 22, no sentido de que viola a boa-fé objetiva a conduta do credor que pretende o rompimento do contrato após receber a maior parte. De acordo com Buzzi, o interesse fundamental não é o bem em si, mas a satisfação do crédito, o que pode ser alcançado por outras vias.
Segundo Buzzi, também em outros contratos similares não é o caso de busca e apreensão do bem, quando há adimplemento da maior parte.
“A teoria do adimplemento substancial visa impedir o uso desequilibrado de direito pelo credor. Pode certamente o credor se valer de meios menos gravosos e mais adequados. Naturalmente, fica preservado o direito de crédito, limitando-se apenas a forma como pode ser exigido pelo credor, que não pode escolher o modo mais gravoso para o devedor.”
Assim, concluiu que não é possível fixar valores em relação à aplicação da teoria do adimplemento substancial, devendo o julgador analisar cada caso, pesando sua gravidade.
No caso em julgamento, a mora de quatro de 48 parcelas, para Marco Buzzi, não autoriza a busca e apreensão e a resolução de pronto do contrato. E assegurou: “A determinação para que a demanda prossiga pelo modo menos gravoso não impede que o próprio bem alienado possa eventualmente vir a servir à satisfação do crédito.”
E dessa forma votou pelo parcial provimento ao recurso apenas para afastar a extinção do processo sem resolução do mérito e determinar o retorno dos autos à origem para que o banco faça emenda da inicial para que a satisfação do crédito seja por modo menos gravoso.
Alienação fiduciária - Enfraquecimento
O ministro Marco Bellizze abriu a divergência, por concluir que é imprópria a invocação da teoria do adimplemento substancial como fundamento para afastar a legítima intenção do credor na busca e apreensão do bem.
Conforme Bellizze afirmou, a teoria do adimplemento substancial não é prevista em lei, e assim é incompatível com a lei especial da alienação fiduciária, que assenta a necessidade de quitação da integralidade da dívida pendente.
“A restituição do bem livre de ônus é condicionada ao pagamento da integralidade da dívida pelo devedor. Não basta que quite quase toda a dívida ou substancial valor. Deve pagar a integralidade.”
O voto do ministro Bellizze classifica como “incongruente” inviabilizar a ação de busca e apreensão quando a lei especial expressamente prevê a possibilidade do bem ficar com o credor fiduciário até seu pagamento integral.
Para Bellizze, entendimento diverso pode levar ao enfraquecimento do instituto de alienação fiduciária, causando inclusive a sensível majoração dos juros nesse tipo de contrato. “Estão cientes ambos os contratantes que a propriedade do bem é do credor.”
Dessa forma, reconheceu a existência do interesse de agir do banco em promover a busca e apreensão independentemente da extensão da mora, determinando o retorno dos autos à origem para prosseguimento da referida ação de busca e apreensão.
Valor expressivo
O ministro Antonio Carlos Ferreira considerou que o julgamento sobre a substancialidade do adimplemento não deve se prender apenas ao critério quantitativo – “há outros elementos que envolvem a contratação e devem ser considerados para avaliação do descumprimento”. Para o ministro, o valor de 8% restante da dívida é “relevante do ponto de vista financeiro”.
“O instituto da alienação fiduciária é bastante útil para a economia do país, e facilita a concessão de crédito e diminui o risco de inadimplência porque assegura ao credor meios eficazes para satisfação do crédito.”
Na mesma linha de raciocínio, o ministro Moura acompanhou a divergência, afirmando que o “sistema da alienação fiduciária é microssistema específico e por isso não daria ensejo à contaminação por essa teoria”.
A ministra Nancy também seguiu a divergência, mas com fundamentação diversa: segundo a ministra, é possível que em algum outro caso a teoria seja aplicável, mas no caso concreto seria “impedir o acesso ao Judiciário” caso a ação de busca e apreensão não prosseguisse. Também formaram a maioria os ministros Moura, Cueva e Gallotti. Ficaram vencidos o relator e o ministro Salomão.
Os advogados Konstantinos Andreopoulos e Rafael Barroso Fontelles, do escritório Barroso Fontelles, Barcellos, Mendonça & Associados, atuaram na causa pelo Banco Volkswagen, tendo o dr. Rafael proferido elogiadíssima sustentação oral na sessão desta quarta-feira, 22.
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