Às sete horas em ponto, lado a lado com suas mochilas, os alunos da Escola Estadual Maria Ilka de Moura se organizam em filas para entoar o Hino Nacional. De um lado, as crianças, do outro, as famílias aproveitam o momento de entrada dos filhos para acompanhar a música e sua entrada nas salas de aula. Com salas de aula equipadas e bem cuidadas, quadra de esportes e área de convivência arborizada e com mesas de xadrez, o cenário da Escola Maria Ilka destoa de grande parte das escolas públicas brasileiras da periferia. Nem sempre, no entanto, foi assim.
Localizada no bairro Bom Pastor, próxima à Favela do Japão, há menos de um ano a escola, construída nos anos 1980, estava prestes a fechar para sempre suas portas. Com mato tomando o prédio, muros derrubados e saques semanais, poucos eram os pais da comunidade que queriam que seus filhos estudassem na instituição, como relata Josenilson Ferreira, de 40 anos. “Tenho quatro filhos. Não queria que nenhum estudasse aqui. Um inclusive estudava em uma escola particular. Aqui era muito bagunçado. Tinha gente que vendia droga na frente da escola, tinha arrombamento todo fim de semana”, diz Josenilson. Hoje, os quatro filhos estudam no colégio.
A Escola Maria Ilka de Moura divide seu muro lateral com a Companhia de Polícia Militar do 9º Batalhão do Bom Pastor. Nem a proximidade dos policiais, no entanto, impedia os saques, furtos e depredações constantes aos quais a escola era submetida. A área da escola era considerada território de fogo cruzado de briga entre duas facções criminosas. No ano passado, o capitão Styvenson, já conhecido por sua atuação na Lei Seca da capital potiguar, conheceu a escola. “Pertencia à companhia e não fazia nem ideia de que isso era uma escola, tamanha era a destruição do prédio. Era mato crescendo por toda parte, tinha até um esgoto a céu aberto”, conta Styvenson.
Acompanhado de alguns policiais da Companhia, Styvenson decidiu tomar medidas para tentar recuperar a escola e restaurar sua reputação diante da comunidade. Começou a juntar doações de material de construção para a reforma e, aos fins de semana, os policiais passaram a tentar recuperar o prédio. A parte mais difícil, porém, estava em garantir a integração entre a instituição e a comunidade.
“A realidade aqui é a seguinte: parte dos pais dessas crianças foi morta pela polícia, parte foi morta em brigas de facções criminosas, parte está presa e outra parte ninguém sabe quem é. Aqui são raras as famílias estruturadas, as famílias que não tenham vivido algum tipo de violência. Grande parte dessas famílias é sustentada pelas mães”, explica. Foi dessa percepção que surgiu a ideia de atrair essas mães para a escola através de cursos profissionalizantes. Firmou-se então uma parceria com o Projeto Mulheres Mil, do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN), para oferecer cursos de cabeleireira, maquiadora e outras especialidades para as mulheres da comunidade.
Daí nasceu a integração entre famílias e escolas. Enquanto as mães realizavam os cursos profissionalizantes, os filhos realizavam atividades esportivas como Taekwondo, fruto de um projeto criado pelo Cabo Rivanaldo, que também é morador da comunidade. Daí em diante, seguiram-se os projetos de revitalização do espaço. Foram instituídas novas regras (lanches industrializados foram proibidos, os horários de chegada ficaram mais rígidos e os pais foram instruídos a acompanharem seus filhos até a porta da escola) e novos estudantes passaram a chegar. Hoje, a escola possui turmas sem vagas para novos candidatos e, nos finais de semana, abre as portas de sua área esportiva para os estudantes. Para o futuro, planos de uma horta para tornar a alimentação saudável e sustentável e, nas paredes, um novo brasão: uma fênix para representar o renascimento do colégio.
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